sábado, 17 de março de 2018

Meditação para o Domingo da Paixão

Pe João Mendes S.J

     O Evangelho deste domingo é um dos episódios culminantes da luta de Cristo com os fariseus, desse fundo desentendimento das vontades humanas perante a Luz, que levou Israel a não aceitar o Redentor e a crucificá-lo. Cristo não discute só com os doutores da lei, mas com os sofismas de todos os homens que amam mais as trevas do que a luz, e que tem medo de Deus e de suas exigências sobrenaturais.
     Na variedade de ideias e incidentes da polemica referida no Evangelho, salientam-se duas linhas gerais, relativas, consequentemente, ao problema da Fé: Cristo vive, intimamente unido ao Pai, cuja glória procura, e cuja doutrina reflete fielmente. E os Fariseus, porque não são de Deus, também, por isso, não ouvem a Cristo que a Deus está unido.

1. CRISTO É " DE DEUS"

     1. A santidade de Cristo. Os fariseus acusavam a Cristo de estar possesso do demônio. Mas o Senhor desafia-os, com segurança divina, a que O acusem de pecado. E como poderiam fazê-lo, se Ele só procura a Glória de Deus, à qual se doou numa consagração perfeita? E é essa pureza absoluta de intenções, esse desprendimento generosíssimo e piedoso, que reverte de Deus Pai para seu Filho, transformando num testemunho de santidade e de verdade. Diante dos Santos, sentimos a proximidade do eterno e do definitivo, da segurança e do amor, - precisamente, porque, neles, o homem se apagou, e adere puramente a Deus, enchendo-se de uma verdade e de uma presença divinas, que os impõe por si mesmos. Devia ter sido assim, e incomparavelmente mais, com N.S Jesus Cristo.
     2. A doutrina de Cristo apresenta o mesmo ar de autenticidade: doutrina pura, impecável, como a do sermão da montanha, que não lisonjeia nenhuma paixão. O Redentor não é mais do que a testemunha do que ouviu do Pai; e se disser que O não conhece, será, como os fariseus, mentiroso. Por isso é que quem ouvir as suas palavras e as guardar, ficará, para sempre, isento da morte. É como se o Senhor dissesse: nas doutrinas e sistemas dos homens, quantos interesses escondidos! justamente, porque essas doutrinas nasceram, os mais das vezes, para justificar-lhes o proceder. Mas com Ele, não é assim. Os seus ensinamentos procedem da fonte mesma da verdade e da vida, sem traição nem desvio, porque Ele está unido ao Pai, com sinceridade puríssima.

2. OS FARISEUS PORQUE NÃO SÃO DE DEUS REJEITAM A CRISTO

     1. O que é ser << ex Deo>>, ou << ex veritate>>. É estar persuadido que a Verdade é santa, porque se confunde com o bem; que a Verdade não é mero pábulo da curiosidade intelectual, e que só nos deve servir para sermos bons. Que utilidade teriam sistemas, e filosofias, e criticas, se não nos ajudassem a vivermos mais humanamente, e sermos melhores?
     A Verdade adquire, assim, caráter sagrado; não pode, portanto, comparecer, diante de nós, como um réu; mas nós é que devemos buscá-la como à razão de ser da nossa vida; como alguma coisa de sacrossanto, que se procura com amor, com pureza, e com infinito respeito. E como a Verdade se confunde, objetivamente, com o Bem, se queremos um atalho para a luz, comecemos por ser, lealmente, bons. Mas como posso eu, sem conhecer explicitamente a Verdade, saber onde está o bem? Pois por certo instinto da consciência, por um raciocínio que anda implícito na nossa vida, e que até os ignorantes e incultos apreendem, por uma espécie de conaturalidade com o Bem verdadeiro. É isto ser de Deus e ser da Verdade.
     2. Os fariseus rejeitaram a Cristo, porque iludiam o puro instinto do Bem; porque tinham o coração cheio de enigmas e desvãos, e de secretas alianças com o mal. Era isso o que os levava a fixarem-se de preferência nas razões que poderiam ter contra Cristo.
     A Verdade, quase sempre nos aparece com algumas sombras; ou por outra: a revelação de Deus não é necessitante. Nesse caso, porque hei de me fixar, de preferência, nas razões positivas e não nas dificuldades? É porque a isso me inclina o sacrário interior da minha vida; o peso e a delicadeza da minha sinceridade última; o pertencer, por natureza, ao partido do Bem e da Bondade; e o não poder ser perfeitamente bom. Se não ao lado de Deus, entregando-me numa doação de amor total. Se não tiver parcialidade pelo bem, não chegarei à Verdade.

CONCLUSÕES

     1. O Pecado contra a luz. Se tivermos algum empenho ou inclinação subconsciente para fugirmos ás verdades da Fé, então, todas as dificuldades e obscuridades nos servirão de pretexto, e por essas fendas se introduzirão, furtivamente, com a aparência de razões fortes, todas as nossas oposições inconfessáveis. E se tivermos, à raiz mesma do coração e da sinceridade, uma vontade essencial de sermos bons, então, esteremos de acordo com Deus; e todas as objeções admitem uma explicação.
     Mas, por mais bem intencionadas e desapaixonadas que julguemos ser ao nosso ponderar as razões, poderemos sustentar, de ânimo tranquilo, o olhar rigoroso da consciência? teremos a garantia absoluta, de que, nos movimentos mais radiculares da vontade, não houve nenhuma fuga para outros interesses? que tivemos de boa vontade sem liga nem mistura? quer dizer: que fomos santos e não encontramos a luz?
     2. A empresa máxima da vida,  o grande acerto da existência, consiste em que, em nós, o desejo da Verdade coincida com o desejo do bem. Na medida em que não coincidirem, pecamos contra a luz. Quem for sincero com a própria consciência, ouve a voz de Deus, põe-se de acordo com Cristo. po isso, quem é de Deus ouve a Cristo que é de Deus: << O que crê no Filho de Deus, tem o testemunho de Deus em si mesmo>>. E é esse o problema que vai até a raiz do nosso ser, até ao âmago da consciência, enquanto ela é a voz do nosso destino. A conquista da verdade pelo amor sutêntico é a formidável empresa de nossa vida.

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