sábado, 3 de março de 2018

Meditação para o 3° Domingo da Quaresma

Pe. João Mendes SJ

     A perícopa que se lê no evangelho de hoje é muito variada. Conta-nos primeiro a cura do demônio mudo- e daí que se costume falar da confissão neste domingo. Vem, depois, o processo de ruína das recaídas no pecado. E finalmente, diante da doutrina do Mestre, há uma mulherzinha que levanta a voz, de entre multidão, para louvar a Mãe que tal filho deu ao mundo. E o Senhor emenda o elogio, fazendo-se reverter, não tanto para os que tenham boa doutrina, quanto para os que, ouvindo a palavra de Deus, a ponham por obra.
     Todas estas ideias se poderão, talvez, agrupar à volta da noção de católico prático.

1. A CASA DOS SETE DEMÔNIOS

     1. Recair é abusar da graça e da misericórdia. A primeira culpa é fruto da ignorância, da fragilidade e da surpresa. Mas as recaídas, normalmente, já não têm as mesmas desculpas, porque o homem já conhecia, tanto a própria fraqueza como a desilusão que é o pecado. Mas houve uma presunção, ou falsa segurança, de quem julga que pode manter-se imune das ocasiões de perigo; e ao mesmo tempo, um pequeno raciocínio, ofensivo da misericórdia de Deus: "Pequei, e que mal me veio daí?" ( Eccl 5,4) . E como o Senhor disse que perdoaria setenta vezes sete, o pecador anima-se a ofendê-lo mais tarde. É o católico " não praticante", ou a tentativa de servir a dois senhores, e de os enganar a ambos.
     2. Recair é escravizar-se a maus amos. Quando o demônio volta à alma que uma vez pecou, e se arrependeu depois, encontra-a tão nova e regenerada como se acabasse de ser criada. Mas traz, consigo, outros sete espíritos piores que o espíritos da primeira culpa. Sete significa número perfeito; aqui, o poder, em pleno, do mal. É que as recaídas são o forjar de algemas com que a alma trabalha para a sua própria escravidão. Os sete demônios são piores que o primeiro, porque são os maus hábitos que nos acorrentam, junto com as graças de Deus que se desmerecem. Sobretudo em certos pecados, como o da impureza, mau é começar. Perdeu-se o brio e o pundonor da integridade que era uma grande força; depois, já parece que um pouco mais ou um pouco menos não trará grande mal; e adquire-se o pendor ou a facilidade de cair que é a pior das fatalidades.

2. FELIZES DOS QUE OUVEM E GUARDAM

     1. Porque conhecem a Deus e se lhe assemelham. A palavra de Deus é uma segunda encarnação, diz Bossuet, comentando a Origenes e a Santo Agostinho. Porquanto, devendo Cristo mostrar-se a todos os homens, e não o tendo feito na verdade da sua carne, fá-lo na verdade da sua palavra. Com o interesse de Zaqueu, subindo a uma árvore para ver passar a Cristo, procuremos também vê-lo, na pregação dos seus Apóstolos.

     Mas, se além de vermos, guardamos, então, assemelhamo-nos ao Divino Exemplar da nossa Divinização. Cumprir a palavra de Cristo faz-nos parecidos ao Pai do Céu, dá-nos traços e feições de família. De tal modo, que se, por absurdo, a maternidade divina não trouxesse consigo a assimilação moral, cumprir a palavra do Senhor seria parentesco mais íntimo que ser mãe de Deus. Foi o que o Mestre confirmou, no lugar paralelo de S. Matheus: " O que fizer a vontade de meu Pai que está no céu, esse é que é meu irmão, e minha irmã, e minha mãe." ( Mat 12,50).
     2. Porque o amor liberta. A fidelidade à Lei, quando é adesão amorosa e não simples formalismo, liberta a alma, e renova-lhe o entusiasmo. Praticar, ser dócil à atração do bem maior, é ver e sentir que o senhor é bom e que vale a pena servi-lo. O amor renova-se com as delicadezas da fidelidade e com a experiência das doações generosas. O motivo por que, muitas vezes, se cai na rotina estéril, é porque se para na generosidade. Se tendermos ao bem maior, o amor transforma-se numa conquista insaciável do Sumo Bem, e encontra, em si mesmo, a alegria que o leve a novas ascensões do coração.
     O católico " não praticante" julga que pode abraçar a Deus e ao mundo, e que encontra a liberdade de movimentos na sua situação dúbia. Mas em vão; porque ninguém pode servir a dois senhores, e porque o verdadeiro desafogo conquista-se na fidelidade ao amor.

CONCLUSÕES

     1. O católico " não praticante". Aí, está uma expressão que muitas vezes se ouve, e que não faz grande sentido. Aquele que " não pratica", no mundo atual, é um contra senso, porque as situações extremas tendem a agravar-se, portanto e esclarecer-se. Em tempos apocalípticos como os nossos, o "não praticante", é um absurdo que a lógica da vida rejeita. Mas em qualquer época, pensar de uma maneira e viver de outra, será sempre hipocrisia e falta de caráter, onde quem acaba por sofrer são as ideias, já que a vida é mais forte do que elas. Este ilogismo, prático, esta ausência de sinceridade para com a verdade, é o caminho mais suave e mais certo para a tristeza moral, para o fastio e para a descrença.
     2. Confissão contrita e sincera. O grande remédio para pormos coerência na nossa vida, é a confissão bem feita, porque ela é, também, a grande prova da nossa sinceridade e boas disposições. Fora casos anormais, quem a sério se arrepende, propõe-se, também a sério, fugir das ocasiões de pecado; e, com certeza, melhora a vida. De maneira que, se caímos na indolência para examinarmos as nossas confissões; porque é muito possível que não sejam sinceras, e nos andemos a enganar a nós mesmos e ao confessor - a Deus, não. A confissão, bem persuadida, é primacial obreira de coerência psicológica e de reforma radical.

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